Amortecendo impactos

Publicado em Andei Pensando..., Educação, Cotidiano, Relacionamento e Psicologia.


Amortecendo impactos

Em 1895, o diretor de educação física da ACM (Associação Cristã de Moços de Massachusetts) William George Morgan, incomodado com as lesões causadas por contato físico na prática da maioria dos esportes, depois de muito pensar criou o Voleibol; um esporte em que os adversários se enfrentariam sem a necessidade desse contato físico, o que em muito facilitaria a participação de pessoas com diferentes faixas etárias, porte físico e gênero.

A presença limitadora de uma rede separando as equipes e a possibilidade de se trabalhar cada jogada em até três toques na bola, além de minimizar a agressividade, viabilizava aspectos que acredito mereçam ser observados em todas as situações de embate que encontramos em nosso dia a dia.

Não estou me referindo a grandes conflitos sociais, merecedores de estudo e interpretações sofisticadas, mas sim a situações cotidianas que em passado recente talvez fossem resolvidas por meio de paciência e diálogo, o que em boa parte das situações resultava em benefício para os dois lados.

Diante de um olhar social que insiste em nos colocar quase sempre em uma posição de defesa, por erroneamente considerarmos pensamentos e atitudes diferentes das nossas como óbvios inimigos, tendemos a nos manter adeptos da pré-histórica teoria do “bateu-levou”. Ao esbarramos em opiniões diferentes das nossas tendemos a nos fechar, desprezando a oportunidade que nos é concedida, tanto de aprender quanto de refletir.

Diante desse receio de ser contestado, criticado e até mesmo desvalorizado, muitas vezes criamos uma atitude de tanta discrição e privacidade que na prática acabam nos isolando e gerando a perda da oportunidade de aprender e a conviver com essa crítica ou novidade. Responder de imediato a uma crítica ou comentário é no mínimo um desperdício na aquisição de informações e pontos de vista que, seja lá de quem vier, depois de assimilados, serão fundamentais na construção de nossa capacidade de percepção, interpretação e interferência no meio em que vivemos.

Profissionais com dificuldade em aceitar as observações de seus pares, casais que só se aceitam em temas que regularmente comungam ou mesmo aprendizes receosos de vivenciar novos conhecimentos brotam cada vez mais de todos os lados, a ponto de nos surpreendermos quando de repente nos deparamos com pessoas dispostas a “esticar os assuntos”, minimizando seus próprios preconceitos e dispostas a aprofundar seus conhecimentos, o que deveria ser uma atitude natural e corriqueira de todos nós.

Observando esses aspectos, repare no funcionamento básico dos três toques que o vôlei permite para cada time, independente se a bola vier mais forte, direta, girando ou mesmo por meio de um toque leve e sutil. Resumidamente, diante do “ataque inimigo” o primeiro atleta amortece, o segundo prepara e o terceiro a devolve a bola, em busca do melhor resultado.

Estar atento ao ouvir, buscando interpretar a linguagem e o momento daquele que se expressa, administrar as informações em pareamento com os conhecimentos já previamente adquiridos e, após elaborar sua opinião, definir as palavras e o tom de suas colocações, é a maneira mais coerente e produtiva de aprender e compartilhar conhecimentos e sentimentos.

A exemplo do vôlei, apesar de cada vez menos comum, essa me parece uma boa maneira de conquistarmos vitórias sem que pessoas se machuquem, independentemente de suas faixas etárias, porte físico e gênero. A vitória daquele que sabe vencer, empatar e até mesmo perder, quando necessário.

Ser resiliente é estar sempre disposto a aprender, ensinar e se adaptar (ferramentas essenciais para uma sobrevivência social saudável), sem se perder em suas características e nunca esquecendo que respostas rápidas, mais que representação de conhecimento, costumam demonstrar ansiedade ou mesmo ignorância de não se aceitar como aprendiz eterno. Redes até fazem parte de nossos jogos.

O que não podemos é construir muros.



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